sexta-feira, 6 de novembro de 2015

A solidão vocacional

"Não fomos feitos para ficarmos sós"

De toda a criação, Deus reconheceu que apenas uma coisa não era boa: que o homem vivesse só. O ser humano é inescapavelmente um ser social e, por isso, toda exceção traz uma marca de sofrimento, inclusive naqueles que, voluntariamente, resolveram afastar-se do convívio em sociedade. Até mesmo estes, talvez, estivessem mais cansados do estilo de vida urbano e das relações sociais repletas de falsidade e interesses mesquinhos, daí uma fuga, até certo ponto, compreensível. É bem verdade que todos temos aspectos da vida em que precisamos experimentar a solidão. Jesus viveu esta solidão de maneira atroz, na cruz - "Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?".

É preciso coragem, integridade e perseverança para atravessarmos os desertos da vida. Eles são necessários para o nosso amadurecimento, para o nosso crescimento espiritual. A solidão é um deserto. Por vezes desejamos apoio, aprovação, reconhecimento, afetos....é natural e não há nada de errado em ter tais necessidades. O convívio familiar, social e na comunidade religiosa deve prover esta necessidade. É um tremendo engano ou pura arrogância, defender que não precisamos do outro e que a decepção não seja uma verdade que pode deixar marcas profundas. Dizer simplesmente "seja você o exemplo do que você deseja pra si" ou ainda: "espelhe-se em Jesus Cristo e não nos outros que são pecadores" parece um lugar comum de fácil sugestão para eximir a nossa responsabilidade de cuidar do outro.

Mais uma vez preciso atacar o institucionalismo religioso. A agenda da instituição, por vezes, é tão sufocante que não permite a relação saudável entre as pessoas. Chamo de "relação saudável" aquele cuidado que podemos ter e que seja recíproco e não apenas uma espécie de balcão de atendimento religioso. O serviço cristão não pode ser profissional, no sentido formal, sob pena de criar um funcionalismo árido focado na atividade programática e não na necessidade das pessoas. É impossível vivermos sem a instituição, mas é imprescindível vencer seus muros, investir nas pessoas enquanto seres com necessidades de afeto e amparo espiritual e não, apenas, como clientes habituais.

Este é o cenário da nossa solidão vocacional. Somos chamados para sermos discípulos de Jesus Cristo, exercendo nossos ministérios, frutificando dons e cuidando dos outros, na parcimônia de quem, às vezes, não é cuidado. Passamos pelo deserto para aprendermos a depender totalmente de Deus. O ambiente é hostil, seco, praticamente sem vida, estamos sozinhos, não há em quem nos apoiarmos, mas é, exatamente, neste silêncio, onde somos provados, somos tentados a abandonar tudo pelo qual somos chamados, assim como nos sentimos abandonados, queremos abandonar, mas é aí onde podemos ouvir a voz de Deus que nos ampara amavelmente: "não temas! Eu sou contigo!".

Acredite, meu irmão, esta solidão vai acabar. Se não acabou ainda é por que resta lições para aprender. Sacrifique tua necessidade do outro com uma dedicação totalmente devotada a Deus e àqueles que te feriram. Este é o teu chamado!

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